Sofrimento no Amor e Amor Patológico
Algumas vezes circunstâncias patológicas podem causar sofrimento no amor, circunstâncias adversas em um dos amantes tornam o relacionamento muito problemático. Entre essas alterações temos, por exemplo, O Amor Patológico, os Transtornos de Personalidade, Transtornos no Controle dos Impulsos, Transtornos Afetivos, etc. Vejamos cada um deles:
Amor Patológico
Embora se reconheça absolutamente a existência do Amor Patológico, sua caracterização clínica é ainda um pouco imprecisa. Havendo associação do Amor Patológico com algum transtorno psiquiátrico, a gravidade e manutenção deste alimentaria esses relacionamentos tensos e conturbados.
Alguns autores (Donnellan, 2005) descreveram o quadro de Amor Patológico como fenômeno decorrente de transtornos ansiosos e depressivos incidindo sobre personalidades específicas (veja Transtorno Esquizóide e Paranóide da Personalidade). Assim, em determinadas personalidades, diante de um eventual estado de estresse prolongado haveria exagerada liberação adrenérgica, predispondo a pessoa a extrema ansiedade, angústia, insegurança (entre outros fenômenos mais patológicos) favorecendo o surgimento do Amor Patológico.
Como acontece com o dependente químico, que se adere à “droga de escolha” para alívio da angústia, ansiedade, inibição psíquica, busca do prazer, o portador de Amor Patológico acredita que conseguirá tudo isso através do lenitivo proporcionado pelo “parceiro de escolha” (Eglacy, 2006).
No início do sentimento amoroso, ocorre sempre uma agradável sensação de bem estar. Mesmo que a pessoa tenha depressão, a paixão exerce um efeito estimulante capaz de proporcionar alívio da angústia e dos sintomas depressivos. Esse bem estar inicial decorre da liberação de adrenalina desencadeada pela sensação amorosa (Simon, 1982).
Ainda segundo Simon, um estudo realizado na década de 80 no New York State Psychiatric Institute constatou que o amor excessivo pode provocar no Sistema Nervoso Central um estado de euforia similar ao induzido por uso de anfetamina. Segundo esse estudo, o amor produziria uma substância intoxicante: a feniletilamina. Isso explicaria, de certa forma, o forte desejo por chocolate – que contém feniletilamina – entre os portadores de Amor Patológico, quando na ausência do companheiro.
Por essa teoria, seria a privação do objeto amado e não o amor, propriamente dito, a causa dos sintomas desagradáveis do Amor Patológico, pois, o parceiro amado traria sensação de bem estar e alívio da angústia.
E de fato, parece não ser mesmo o sentimento de amor o causador dos malefícios do Amor Patológico, mas sim o medo da pessoa ficar só, o temor de vir a ser abandonada, de não ser valorizada. Isso tudo é que origina a falta de liberdade em relação às próprias condutas, o grande desconforto emocional e submissão obsessiva da pessoa portadora de Amor Patológico.
Portanto, em termos psicológicos parece que o “defeito” da patologia do amor não é o amor em si, propriamente dito, aquele amor “da atenção, carinho, zelo e cuidados em relação à pessoa amada”, citado acima. O Amor Patológico, por sua vez, parece ser descendente direto do medo, do medo egoísta de ficar só, do medo de alguém mais merecedor conquistar a pessoa amada, medo de não ter seu valor reconhecido como gostaria, de não estar recebendo o amor que acha merecido, de vir a ser abandonado (Moss, 1995). Seria, portanto, muito mais um defeito do caráter de quem “acha” que ama demais, do que do sentimento amor.
Dentro da fisiopatologia psíquica o Amor Patológico pode ser considerado como um comportamento obsessivo-compulsivo em relação ao objeto amado. Tavares e Zilberman citam uma pesquisa realizada na Itália, que envolveu 20 pessoas que disseram estar amando recentemente (últimos seis meses), 20 com Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) não medicadas e 20 normais (controles). Os resultados comprovaram ocorrer alterações neuroquímicas semelhantes no transporte da serotonina (5-HT) em portadores de TOC e de Amor Patológico. Ambos apresentaram índices significativamente inferiores aos indivíduos normais (Sophia, 2007). Outros autores pensam no Amor Patológico como um subtipo de Transtorno de Personalidade, mais precisamente, uma Personalidade Dependente (Ellis, 2002).
De modo geral, o aspecto central no Amor Patológico é o comportamento repetitivo e sem controle de prestar cuidados e atenção (desmedidos ou não) ao objeto amado com a intenção de receber o seu afeto e evitar a perda. Para o diagnóstico é importante que essa atitude “zelosa” excessiva seja mantida mesmo diante de evidências concretas de que está sendo prejudicial para alguém.
Na realidade, parece que a alteração principal é no Ego do próprio paciente (invariavelmente inflado), que experimenta um pavor de sofrer a perda da pessoa amada, um medo gigantesco de não ser correspondido, um sentimento apavorante de ser traído, enfim, parece que a própria pessoa amada é apenas coadjuvante no relacionamento.
Classificação do Amor Patológico
Procurando o Amor Patológico dentro dos critérios e classificações psiquiátricas mais reconhecidas, para que tudo não fique no território da poesia e do romantismo, algumas pesquisas (Bogerts, 2005 – Tarumi, 2004) vêm sabiamente situando o Amor Patológico dentro do espectro dos comportamentos obsessivo-compulsivos, em relação ao parceiro
O componente central na sintomatologia do Amor Patológico é o comportamento caracteristicamente repetitivo e sem controle, obsessivamente dirigido à prestação de cuidados e atenção sufocante à pessoa amada. Há sinais da carência de críticas sobre o comportamento obcecado, notadamente quando essa atitude excessiva é mantida mesmo depois das concretas evidências de estar sendo prejudicial para a sua própria vida, da pessoa amada e/ou para seus familiares.
É interessante que alguns critérios de diagnóstico para o Amor Patológico se assemelhem aos critérios empregados para o diagnóstico da Dependência ao Álcool e outras drogas, conforme o DSM.IV (American PsychiAtric Association. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders. 4th ed. Washington, DC, American Psychiatric Association; 1994).
Segundo esse DSM.IV, são sete os critérios para esse diagnóstico, sendo três deles obrigatórios.
Sophia, Tavares e Zilberman comparam os critérios para diagnóstico de dependência química com as características normalmente apresentadas pelos portadores de Amor Patológico, e constatam que pelo menos seis deles são comuns às duas patologias:
1) Sinais e sintomas de abstinência -quando o parceiro está distante (física ou emocionalmente) ou perante ameaça de abandono, podem ocorrer: insônia, taquicardia, tensão muscular, alternando períodos de letargia e intensa atividade.
2) O ato de cuidar do parceiro ocorre em maior quantidade do que o indivíduo gostaria -o indivíduo costuma se queixar de manifestar atenção ao parceiro com maior freqüência ou período mais longo do que pretendia de início.
3) Atitudes para reduzir ou controlar o comportamento patológico são mal-sucedidas -em geral, já ocorreram tentativas frustradas de diminuir ou interromper a atenção despendida ao companheiro.
4) É despendido muito tempo para controlar as atividades do parceiro -a maior parte da energia e do tempo do indivíduo são gastos com atitudes e pensamentos para manter o parceiro sob controle.
5) Abandono de interesses e atividades antes valorizadas – como o indivíduo passa a viver em função dos interesses do parceiro, as atividades propiciadoras da realização pessoal e profissional são deixadas, como cuidado com filhos, atividades profissionais, convívio com colegas. entre outras.
6) 0 Amor Patológico é mantido, apesar dos problemas pessoais e familiares -mesmo consciente dos danos advindos desse comportamento para sua qualidade de vida, persiste a queixa de não conseguir controlar tal conduta.